30 setembro 2011

Cadeiras.

Os dados estão a rolar. Primeiro um, depois outro, de seguida mais um. De repente, a mesa parece pequena para tantas peças em movimento. Velocidade. Desejo. Confusões. Atropelos.

No meio de tudo isto, sinto-me a peça parada. O dado que não rola. Todos se movem mais depressa que eu. À minha frente está um caminho, como se todos se mexessem em meu redor e me deixassem um corredor aberto. Mas é um corredor escuro, duvidoso, apertado como uma linha, sem finais felizes la à frente. Sem nada no fim. Sem fim.

Os dados rolam. As peças encaixam aqui e ali. Outras desencaixam para encaixarem mais à frente. Melhor ou pior, todas cabem em algum lugar. Todas... Menos eu.

Como no jogo das cadeiras. Em que, no fim, há gente a mais para cadeiras a menos. Parece que todos estão a descobrir os passos certos a dar para alcançarem as suas cadeiras, com mais ou menos percalços pelo caminho.

Eu sigo descalça. Passos difíceis, incertos e perdidos. Não há cadeira aqui nem lá ao fundo. Vão todos encontrar uma. Alguém há-de ficar com a que devia ser minha. A minha cadeira. O lugar que eu quis tanto. Assento de alguém que não eu.

Todos sentados. Descansados. E eu sigo a pé. Sempre.

26 setembro 2011

Do bichinho.

Há músicas que um dia vou passar na telefonia. E vai ser o prazer de uma vida cruzar-me com elas no éter, numa espécie de romance entre mim e o som. E logo eu, que respiro rádio e canções.

Algumas das especiais têm passado por mim nestes dias. Aliás, têm sido dias ricos em acordes, estes. Pedacinhos de som resgatados da poeira do tempo que passou e que dão sentido a tudo num piscar de olhos, num respirar em que a música separa o inspirar do expirar por breves segundos.

Esta é só uma. De entre dezenas que dão um nó na barriga.

 

19 setembro 2011

PF.

"How I wish, how I wish you were here. 
We're just two lost souls 
Swimming in a fish bowl, 
Year after year...
Running over the same old ground, 
What have we found? 
The same old fears. 
Wish you were here."

[Palavras para quê?]

15 setembro 2011

Coisas muitas e uma coisa muito minha.

Consciente que estou do risco que corro de que a partir deste momento duvidem da minha sanidade...

A NASA está a montar um novo foguetão. O maior de todos. Querem pousar em Marte em 2017, sem gente. E querem pousar outra vez, mas com gente, em 2030.

E eu aqui, cabeça literalmente na Lua, com isto a mexer-me com o sistema. A fazer contas para perceber que em 2030 já passei dos 40. E nem pensar em dar ouvidos às vozes dos outros e à que se forma na minha cabeça, no cantinho racional, a dizerem "que disparate". Sonhar não faz mal, é remédio de graça, e sempre tive este apelo em mim (que, em boa verdade, nunca entendi muito bem).

É como se houvesse um pedacinho meu perdido pelo espaço. Uma tirinha de alma, talvez, que chama por mim lá de algum lado e que eu preciso de alcançar. Misturo ciência e fé numa confusão sem lógica nenhuma, num perfeito e absoluto disparate, num delírio que nem para mim faz sentido ― mas que é a única maneira de explicar (ou não) esta minha vontade, este desejo íntimo, interior e desesperado de pôr o pé em qualquer coisa que me projecte até à Lua.

Ou até Marte.

Queria tanto. Tanto.

13 setembro 2011

Olhos.

E é então que ela me arregala os olhos e me manda ter esperança. E "manda" é a palavra certa. Sem meias-tintas, sem tolerâncias. Como fazem as irmãs mais velhas, as conselheiras, os ombros de todos os dias, as que nos agarram antes de cairmos e nos atiram lá bem para longe, para que a ideia de desistir não volte a passar-nos tão depressa pela cabeça.

Arregala-me os olhos em jeito de quem diz coisas importantes e que, naturalmente, são conselhos para toda a vida. Arregala-os porque estou mal, porque me vê a dar passos confusos na direcção errada. E por isso diz-me palavras firmes, convictas, simples e directas, e assim puxa por uma parte de mim que decidi esconder aos poucos.

Há dias em que a minha luz se some. Mas, antes que se apague, ela chega e deita achas, muitas, para a fogueira - de olhos arregalados, sim, olhos que são para levar a sério. Olhos de quem toma conta de mim.

Obrigada. És um presente que o éter me deixou para sempre.

:)

08 setembro 2011

Ervilha.

É como se a vida fosse a melhor prova e a mais definitiva de que há duas mãos lá em cima a mover as peças. As peças somos nós, sou eu e os eus à minha volta, e os tus, e os eles deles e dos outros. E nos movimentos aparentemente mais desconexos descobre-se a coerência, a lógica presente no que nunca poderia ter encaixado, mas encaixou. Tu que o conheces a ele, que esteve com ela, que se encontrou comigo, que te conheço a ti. Gente que vem do passado, gente que passou a meio do caminho, gente que se instalou no presente e promete continuar pelo futuro. E, inexplicavelmente, parte destas pessoas cruzam-se num pontinho qualquer a meio da estrada. Como se, no fim, tudo fizesse sentido. Linhas que se tocam, que se ligam, baptizadas com a frase “o mundo é uma ervilha”, tão intensa e justificada que merece estampagem num letreiro a néon.

02 setembro 2011

Casa.


Fico sem perceber muito bem o que é “sorte” e “azar” no meio disto tudo. De repente ocorre-me a piadola fácil e sem graça, apelando à memória de há umas semanas atrás: “a sorte é uma cena que a mim não me assiste”. Mas, em boa verdade, não sei se é falta de sorte ou se é uma sorte diferente. Não consigo distinguir, ainda, o positivo do negativo, o bom do mau, nem consigo admitir o mal necessário em prol de um bem maior. É tudo confuso, com fronteiras pouco nítidas, coisas muito diferentes que se enrolam umas nas outras.

Este é um caminho que não posso adivinhar antes de o pisar. Por agora segue coberto de nevoeiro, como desde sempre. E, como num jogo, não faltam casas no tabuleiro. A casa que se conhece, a casa que já se não quer, a casa que nunca será casa, a casa que foi casa sem o ser, a casa que ainda não é casa mas que se quer que o seja.