31 outubro 2010

Fio.


Há um fio que está a prender uma série de coisas umas às outras. Nada vive sem o resto. Quando uma morrer, talvez morra tudo. Mas, por agora, há vida.

Antes não houvesse. Os breves instantes de adormecimento dão lugar à mais pura consciência, e o que está dormente fica, num instante, dorido e afiado como um punhal. Tentar ignorar é escusado; talvez o tempo faça esse serviço. Acredito que o passar dos dias torne as coisas menos cruas, que os espinhos deixem de arranhar, que as recordações não moam, que o futuro não assuste e que o presente não canse. Mas, por agora, custa-me a vida do que vive em mim.

29 outubro 2010

Twisted. Katie Melua.

É deliciosa, esta música. Não sei por que é que só hoje é que dei conta disso. (Giro, giro, era haver um vídeo diferente deste... Mas pronto, é o que se  consegue arranjar.)


28 outubro 2010

Simbólico.

Isto está tão mau, mas tão mau, mas tão mau, que só vejo um caminho:

tenho de te agarrar, rasgar-te em mil pedaços e pegar-te fogo.

(É claro que, no fim, vou acabar por guardar as cinzas, porque há sempre uma parte de mim que não consegue deixar-te ir completamente.)

21 outubro 2010

Cimento.


Parede a parede. Constrói-se o futuro sobre o passado dos outros. Destrói-se. Deita-se abaixo à pancada. Já nem o que era nosso existe agora. Matam-se as recordações em rasgos de orgulho e de loucura mal-disfarçada. Quantas chapadas temos de levar para nos habituarmos a que o nosso passado seja posse dos outros, sem que haja maneira de o preservar noutro sítio que não na nossa memória? Já não há nada. Foi-se tudo. Destruído. Poucos lhes importa o quanto dói. O futuro tem de ser soberano, nem que para isso tenha de ser construído sobre escombros de recordações de quem não pediu nada disto. Não resta nada. Tudo morto, desaparecido, um espaço que o era e já não o é. Dantes voltar ali era voltar ao passado; agora não é voltar a nada. É certo que a vida tem de continuar, que as coisas mudam... Mas não é justo mexerem no nosso passado, desfazerem-no em pó, sem sequer pedirem licença. Não pode ser justo, isto. Não pode estar certo. Era tudo nosso e não deles, mas eles mandam, e é só. Por isso, destroem. Esmagam. Não sei explicar muito bem a ligação que ganhamos aos sítios, mas certo é que ela existe, e de repente esses sítios já só vivem na nossa memória, porque nunca ninguém voltará a vê-los ou a passar por eles ou a viver o tanto que se vivia neles. Desapareceram para sempre. Nunca nada vai voltar a ser igual. É impossível.


O meu passado ali foi desfeito. Já nada existe. Nada. O pouco que existia... O pequeno elo que mantinha o passado vivo, que mantinha a ideia de normalidade, de regresso a casa, de que um dia tudo pudesse voltar a ser parecido com o que era dantes, que mantinha a esperança de um dia regressar ao que foi tão meu... Desapareceu. Já pouco ou nada resta daquilo que fazia de certos sítios os meus sítios. Mataram. Mataram tudo. Tudo, tudo, tudo. E eu estou de cabeça e coração tão desarrumados.

07 outubro 2010

Não é que costume ouvi-los

mas gostei desta parte.

"You and me, meant to be immutable, impossible. It's destiny, pure lunacy, incalculable, insufferable. But, for the last time, you're everything that I want and ask for. You're all that I'd dreamed."

(Smashing Pumpkins - Stand Inside Your Love)

06 outubro 2010

Espaço.

Preciso que saias daqui. Por favor. Estás a ocupar espaço a mais, e espaço que não te devia pertencer. Resolvi dar-to sem mo pedires mas agora quero-o de volta sem que esperes mantê-lo. No meu espaço mando eu, e preciso urgentemente que o desocupes.

Assim não consigo andar para a frente. A culpa é mais minha do que tua, claro, mas não consigo resolver isto sozinha. Por isso, colabora e vai-te embora de mim. O meu espaço que é teu tem de voltar a ser meu e só meu. Preciso de o guardar, de tomar conta dele. Cada vez que tento alcançá-lo e empurrar-te para fora de lá, vou contra uma parede, ou uma porta fechada, e não há maneira de entrar.

Estou cansada disto. Por favor, vai-te embora. Já que ocupaste o espaço, por tua vontade e meu consentimento, mas dele não fazes nada... Então parte.  Preciso de seguir o meu caminho. E só não o consigo fazer por tua causa.

Porque não te sei deixar ir...

02 outubro 2010

Baú.

Há coisas que fechámos tão, tão bem no baú - julgamos nós. E depois, um dia, encontramos a chave, mais ou menos por acaso. E nem queremos utilizá-la. Preferimos ignorar, esquecer que ela apareceu, fingir que não a vimos. Mas por qualquer motivo, nosso ou de quem está à volta, pegamos nela e abrimos o baú. Não há-de fazer mal, pensamos; não há-de custar, não há-de doer. O tempo que passou já deve ter sarado as feridas, caramba. Não pode ser assim tão difícil ou tão doloroso encarar o que lá ficou atrás, guardado, ignorado e escondido. Por isso, pegamos em toda a coragem que temos, metemos a chave na fechadura e "click", o baú abre-se. E conforme se abre, há uma espiral de coisas que vêm à cabeça. Queremos ser fortes, manter a pose, mas é inútil. Ainda nem espreitámos lá para dentro e a ferida já está aberta outra vez. E sabe tão mal. E ao mesmo tempo sabe tão bem. 

Não posso deitar este baú fora. Não posso, não quero, não é sequer possível. Nunca. Guardo lá tanto, tanto, tanto. É um baú tão cheio... Tudo o que se possa imaginar cabe lá dentro. E vive lá dentro.

Acho que vai ser assim para sempre. Há coisas que não mudam. Que não se resolvem. Feridas que ficam abertas para a eternidade. Dores que persistem, e sorrisos que, ao mesmo tempo, persistem com elas.