14 dezembro 2011

Do cúmulo.


A estupidez. Pegajosa, invasiva, exploratória.
O respeito que não se tem, a noção que não se criou, a burrice sem limites. A incapacidade pura e simples de tudo e para tudo. O absurdo, as enormidades atrás de enormidades.
O marasmo na vida, nas vidas, nas coisas. O marasmo no que é palpável e no que anda no ar, nos ouvidos, nas vozes, nas cabeças e nas almas.
O sem nexo. O incoerente.
O cúmulo dos cúmulos de tudo o que é errado, idiota, impensável. Estúpido.
O impossível.

E os corações e as gentes submersos nestas coisas todas.
E tão zangados. Tão tristes. Tão apáticos.

05 dezembro 2011

Notas.

Nesta altura a minha vida faz-se de notas soltas, perdidas aqui e ali, coladas a sítios, a pessoas, ao passado, ao que o presente vê no futuro.

Há notas agarradas a ti, no que foi sem ser, e a mim, que me sinto tão presa quanto me sinto distante. O coração varia ao sabor de muitas coisas. Há uma nota mental que diz que já não gosto do que me fizeste e que já quase não sei gostar do que me deste. Uma nota que serve para eu não me esquecer nunca de que os passos são para ser dados em frente. Nem para trás, nem para os lados. Frente. Só.

Há notas presas às pessoas que me rodeiam, em jeito de manual de instruções. Não posso perder-me nem esquecer-me de como se lida com elas. E a minha cabeça é demasiado linear para as curvas que certa gente dá. No discurso, na postura, nos princípios que defendem e nos fins que ambicionam. Sim. Sou demasiado linear para retorcimentos e perco-me neles com muita facilidade. Preciso de notas que me lembrem qual é o caminho a seguir. E que me recordem que, mais uma vez, é imperativo segui-lo em frente. Porque seguir para o lado é ser quem não sou. E voltar para trás é negar o que aprendi a ser.

E há notas penduradas em mim e só em mim. Para que não me perca no meio de todas as outras notas que vou deixando por aí, para me lembrar de guardar espaço para mim, para me obrigar a encontrar-me. Parece que sou de tudo e de todos menos minha. Divido a alma em mil pedaços, e o pedacinho que sobra para mim está atafulhado, sem espaço para mais nada, reservado para pensar em soluções - a menos - para problemas - a mais.

Mas no fim... É sempre mais fácil esquecer-me de mim.
E lembrar-me de todos. E de tudo.
Vou lutando por ser eu no meio de quem não é ninguém.
Afogo-me em notas mas não me esqueço de nenhuma.
E por vezes lembro-me de ti.
Mas já não faz mal.

21 novembro 2011

Uma questão de lados.


Dou por mim sentada numa poltrona. Do lado de cá, estou eu, com uma fina barreira a separar-me da confusão. Por pouco, não fico submersa. Luto contra a proximidade que se impõe e obrigo-me a ficar na poltrona. Afinal de contas, é mais confortável. A vista é melhor. E apreciar as sagas do lado de fora, como se não fossem as nossas, tem um sabor curioso. Confuso, até irritante, mas curioso.

Do lado de lá, há de tudo. Há barulho, gritos, confusão. Gente indignada com gente baralhada. Gente que aplaude uma mini-catástrofe disfarçada de conquista. Gente que não sabe do que fala e por isso acha que fala de algo bom. Gente que engana, gente que se enganou e gente que se deixa enganar. Do lado de cá, permaneço eu, sem saber o que faça: divido-me entre a vontade retorcida de bater palmas com os enganados, juntando-me à farsa como se caísse nela, e o desejo de desfazer os equívocos a alto e bom som, em palavras escritas aos gritos, porque está na hora de acordar o mundo para o absurdo.

Tenho a verdade e o engano nas mãos. A verdade numa, o engano na outra. Sei o que uns sabem e sei o que os outros não dizem. Conheço tão bem o real quanto a confusão. Mas ninguém sabe disso – nem de um lado, nem do outro. Não sei que caminho siga; sinto o juízo rasgado a meio, entre o conforto da poltrona e a urgência dos pontos nos i’s.

17 novembro 2011

21 outubro 2011

Da confusão dos últimos tempos.


Muitos meses depois. Um ano mais tarde. E as feridas que não saram. Que não saem de mim, que doem com uma dor diferente mas que não deixam de doer.

Há marcas que ficam. Mais ou menos dormentes, consoante os dias, mas nunca desaparecem por completo. E não é preciso muito para a alma ficar em pedaços outra vez. Pedaços esquisitos, diferentes... Mas pedaços. Que doem quando se abrem e se separam.

O passado foi lá atrás, mas não me larga. Subsistem os estilhaços, cá dentro. E não há cola que mos cole. Há, em vez disso, novos bocados de mim para quebrar. E é o tempo que não passa, e é a vida que não muda, e é o futuro que não chega. Errados a acumularem-se onde deviam aparecer certos, nem que fosse de vez em quando, para lhe tomar o gosto. Já esqueci o sabor de tantas coisas...

E são os olhos que dizem tudo. Mas não falam. E eu queria que falassem, que uma voz lhes desse voz. E sentido. Queria palavras nos olhares.

16 outubro 2011

A magia da rádio.

A magia da rádio? Simples.

Duas pessoas que se encontraram no éter e que os senhores do éter se encarregaram de separar. Muito tempo depois, afastados como o Norte do Sul, numa noite o éter une-os outra vez. Um em viagem para o Porto, outra parada em Lisboa. Os dois na mesma frequência. Os dois em sintonia. Sem saberem, de início, mas apercebendo-se depois. Mensagens para lá e para cá, memórias a fluir a propósito das músicas que vão passando, risadas de quem se conhece bem e que já sabe o que outro vai dizer ou fazer ao som da canção que se segue.

É em momentos assim que se sente a verdadeira força do éter. Por mais que os senhores separem, a rádio há-de sempre juntar quem a respira. E junta de uma maneira muito especial, impossível de explicar, e digna de um sorriso único, que só aparece em momentos assim... Momentos de peito cheio de mil coisas sem nome, entre as recordações boas e a lagriminha tranquila mas teimosa ao canto do olho. A alma de viagem ao passado. Instantes maiores ou mais pequenos, mas únicos. Indescritíveis. Puramente mágicos.

Com tanto ou tão pouco, a noite mais comum de todas tornou-se nisso mesmo: numa noite mágica. Porque este fio invisível que mantém as pessoas unidas é obra dela - da magia da rádio.

12 outubro 2011

Posso pedir um desejo?


Sem pestanas caídas, passas fora de época, velas mordidas antes da data ou estrelas cadentes quando ainda está sol?

Hoje é um daqueles dias em que queria poder segurar o coração de algumas pessoas. Para não deixar que ninguém nem nada de mau as magoasse. Agarrar-lhes a alma com as duas mãos e prendê-la, confortá-la. Hoje queria salvar, queria proteger. Queria guardar e resguardar.

Queria tanto.

Posso?

03 outubro 2011

[Im]Paciência.


A paciência é uma linha. Pequena, magrinha. Mirrada, seca. É um saco vazio, uma caixa oca. É menos que zero. Saldo negativo nas contas do que se tolera. Coração à beirinha, sem mais espaço para um passo que seja. Tropeçar na língua afiada. A parede já não é parede, cai-lhe o “pa” e é só rede, de buracos tão largos que tudo passa por eles. Diz-se o que a alma diz, sem filtros sociais ou de bom senso. E tudo sai por fora, transborda porque é demais para caber cá dentro.

30 setembro 2011

Cadeiras.

Os dados estão a rolar. Primeiro um, depois outro, de seguida mais um. De repente, a mesa parece pequena para tantas peças em movimento. Velocidade. Desejo. Confusões. Atropelos.

No meio de tudo isto, sinto-me a peça parada. O dado que não rola. Todos se movem mais depressa que eu. À minha frente está um caminho, como se todos se mexessem em meu redor e me deixassem um corredor aberto. Mas é um corredor escuro, duvidoso, apertado como uma linha, sem finais felizes la à frente. Sem nada no fim. Sem fim.

Os dados rolam. As peças encaixam aqui e ali. Outras desencaixam para encaixarem mais à frente. Melhor ou pior, todas cabem em algum lugar. Todas... Menos eu.

Como no jogo das cadeiras. Em que, no fim, há gente a mais para cadeiras a menos. Parece que todos estão a descobrir os passos certos a dar para alcançarem as suas cadeiras, com mais ou menos percalços pelo caminho.

Eu sigo descalça. Passos difíceis, incertos e perdidos. Não há cadeira aqui nem lá ao fundo. Vão todos encontrar uma. Alguém há-de ficar com a que devia ser minha. A minha cadeira. O lugar que eu quis tanto. Assento de alguém que não eu.

Todos sentados. Descansados. E eu sigo a pé. Sempre.

26 setembro 2011

Do bichinho.

Há músicas que um dia vou passar na telefonia. E vai ser o prazer de uma vida cruzar-me com elas no éter, numa espécie de romance entre mim e o som. E logo eu, que respiro rádio e canções.

Algumas das especiais têm passado por mim nestes dias. Aliás, têm sido dias ricos em acordes, estes. Pedacinhos de som resgatados da poeira do tempo que passou e que dão sentido a tudo num piscar de olhos, num respirar em que a música separa o inspirar do expirar por breves segundos.

Esta é só uma. De entre dezenas que dão um nó na barriga.

 

19 setembro 2011

PF.

"How I wish, how I wish you were here. 
We're just two lost souls 
Swimming in a fish bowl, 
Year after year...
Running over the same old ground, 
What have we found? 
The same old fears. 
Wish you were here."

[Palavras para quê?]

15 setembro 2011

Coisas muitas e uma coisa muito minha.

Consciente que estou do risco que corro de que a partir deste momento duvidem da minha sanidade...

A NASA está a montar um novo foguetão. O maior de todos. Querem pousar em Marte em 2017, sem gente. E querem pousar outra vez, mas com gente, em 2030.

E eu aqui, cabeça literalmente na Lua, com isto a mexer-me com o sistema. A fazer contas para perceber que em 2030 já passei dos 40. E nem pensar em dar ouvidos às vozes dos outros e à que se forma na minha cabeça, no cantinho racional, a dizerem "que disparate". Sonhar não faz mal, é remédio de graça, e sempre tive este apelo em mim (que, em boa verdade, nunca entendi muito bem).

É como se houvesse um pedacinho meu perdido pelo espaço. Uma tirinha de alma, talvez, que chama por mim lá de algum lado e que eu preciso de alcançar. Misturo ciência e fé numa confusão sem lógica nenhuma, num perfeito e absoluto disparate, num delírio que nem para mim faz sentido ― mas que é a única maneira de explicar (ou não) esta minha vontade, este desejo íntimo, interior e desesperado de pôr o pé em qualquer coisa que me projecte até à Lua.

Ou até Marte.

Queria tanto. Tanto.

13 setembro 2011

Olhos.

E é então que ela me arregala os olhos e me manda ter esperança. E "manda" é a palavra certa. Sem meias-tintas, sem tolerâncias. Como fazem as irmãs mais velhas, as conselheiras, os ombros de todos os dias, as que nos agarram antes de cairmos e nos atiram lá bem para longe, para que a ideia de desistir não volte a passar-nos tão depressa pela cabeça.

Arregala-me os olhos em jeito de quem diz coisas importantes e que, naturalmente, são conselhos para toda a vida. Arregala-os porque estou mal, porque me vê a dar passos confusos na direcção errada. E por isso diz-me palavras firmes, convictas, simples e directas, e assim puxa por uma parte de mim que decidi esconder aos poucos.

Há dias em que a minha luz se some. Mas, antes que se apague, ela chega e deita achas, muitas, para a fogueira - de olhos arregalados, sim, olhos que são para levar a sério. Olhos de quem toma conta de mim.

Obrigada. És um presente que o éter me deixou para sempre.

:)

08 setembro 2011

Ervilha.

É como se a vida fosse a melhor prova e a mais definitiva de que há duas mãos lá em cima a mover as peças. As peças somos nós, sou eu e os eus à minha volta, e os tus, e os eles deles e dos outros. E nos movimentos aparentemente mais desconexos descobre-se a coerência, a lógica presente no que nunca poderia ter encaixado, mas encaixou. Tu que o conheces a ele, que esteve com ela, que se encontrou comigo, que te conheço a ti. Gente que vem do passado, gente que passou a meio do caminho, gente que se instalou no presente e promete continuar pelo futuro. E, inexplicavelmente, parte destas pessoas cruzam-se num pontinho qualquer a meio da estrada. Como se, no fim, tudo fizesse sentido. Linhas que se tocam, que se ligam, baptizadas com a frase “o mundo é uma ervilha”, tão intensa e justificada que merece estampagem num letreiro a néon.

02 setembro 2011

Casa.


Fico sem perceber muito bem o que é “sorte” e “azar” no meio disto tudo. De repente ocorre-me a piadola fácil e sem graça, apelando à memória de há umas semanas atrás: “a sorte é uma cena que a mim não me assiste”. Mas, em boa verdade, não sei se é falta de sorte ou se é uma sorte diferente. Não consigo distinguir, ainda, o positivo do negativo, o bom do mau, nem consigo admitir o mal necessário em prol de um bem maior. É tudo confuso, com fronteiras pouco nítidas, coisas muito diferentes que se enrolam umas nas outras.

Este é um caminho que não posso adivinhar antes de o pisar. Por agora segue coberto de nevoeiro, como desde sempre. E, como num jogo, não faltam casas no tabuleiro. A casa que se conhece, a casa que já se não quer, a casa que nunca será casa, a casa que foi casa sem o ser, a casa que ainda não é casa mas que se quer que o seja.

31 agosto 2011

Envelope.

Toda a fé numa carta que me leva lá dentro. Toda a fé numa carta de coração aberto, em jeito de menina cansada e obstinada. Toda a fé numa carta das antigas, das que sabem bem, das que já pouco se fazem, das que metem papel, envelope e selo ao barulho, na teimosia de querer fazer bonito e bem-feito, adequado ao destinatário e à ocasião. Toda a fé numa carta que segue em correio azul, na pressa de quem não quer esperar mais, na urgência de quem quer fugir. Toda a fé numa carta e em que ela se transforme no bilhete de ida sem volta. Toda a fé na bondade do destinatário, que todos referem, destacam, relembram, prometem.

Fé na fé. Fé no meio da pouca fé que tenho.

17 agosto 2011

.


Há pessoas que não acreditam no lado bom dos outros. Vêem-no mas acham sempre que é mentira. Ninguém pode ser assim tão bom, caramba. Acham que os bons não passam de maus, só que são maus muito espertos. Acham que há sempre um lado malvado, retorcido, escuro, MAU. Mesmo que ele não exista. Insinua-se eternamente que está lá; em casos extremos, assume-se que está mesmo. Lida-se com quem é bom como se fosse mau. Porque a pessoa boa não pode ser boa. A pessoa boa é tão má como as outras. A pessoa boa forra-se de bondade mas é feia, lá dentro. Em caso de dúvida, opta-se por castigar o inocente. E de nada valem desculpas, justificações. A verdade de nada vale. Porque, se quem ouve assim quer, a verdade é simplesmente mentira.

Mesmo que não seja. Mesmo que seja a mais pura das verdades, de nada vale lançá-la aos ouvidos de quem decide não acreditar e infernizar a alma a quem nada fez. Mesmo que o lado mau seja pequenino, pequenino, pequenino, e que não se tenha sequer manifestado, é só ele que importa, que interessa e que, supostamente, se sobrepõe a tudo.

Só se vê o que se quer ver. Porque o orgulho é cego. É uma m***a. Mata o que une as pessoas. Porquê? Porque sim. O nome é a resposta - orgulho.

De repente a mais pura verdade é mentira. De repente tudo o que se diz é interpretado ao contrário. De repente os esforços de uma vida inteira valem muito, muito, muito menos que nada. E a vida segue quase morta, com cada passo dado com uma faca enorme no coração.

08 agosto 2011

Puro génio fotográfico.

Ver a ironia do destino da bancada. Em silêncio. Uma fotografia, duas pessoas. E eu, sem as conhecer, sei mais das ambições de um e do futuro do outro do que elas próprias. A inocente ignorância do sabichão. E o lado retorcido, amarelado, do que finge o sorriso afável. Puro teatro.
Há imagens que valem milhões... E só eu é que sei disso.

28 julho 2011

O limite da exaustão.


Todo o “eu” é um grito. Aflito, sufocado, de quem não aguenta mais. De quem não aguenta mesmo mais.

Um grito mudo, surdo nos ouvidos de quem devia dar por ele. Tão surdo! Tão sem som! Estou a gritar tanto, tanto, no desespero mais profundo, saído do lado mais escuro de mim, uma coisa que eu nunca vi, nem nunca ouvi, e agora está alto e a bom som na minha cabeça, no meu corpo, à minha volta, como se eu estivesse numa cápsula feita desse grito, está na aflição, na mão invisível que agarra o pescoço, nos olhos que deitam rios, no desespero mais pleno… Um grito, um grito, um GRITO!

… E não me ouvem. 

Quero correr até as pernas ficarem moles e não me deixarem continuar nem por mais um passo. Quero correr, fugir, vento na alma, vento cá dentro. Quero desfazer-me em pó nesse vento, e quero que depois ele me espalhe por aí para que não me encontrem. Que ninguém saiba mais de mim. A seu tempo tratarei de me juntar, da poeira aos pedaços e depois ao eu inteiro, mas longe, tão longe que já nada doa, que já nada massacre, que já nada lembre.

Dói-me o passado, dói-me o presente, dói-me tanto o futuro. Dói-me o físico, o não-físico, as sensações, os desgostos. Até me doem coisas que nem sei o que são. Dói-me o desespero e o grito que cada vez é mais alto e que ao mesmo tempo é tão desesperadamente mudo aos ouvidos de quem mo cria, como se caísse no vácuo. Num buraco negro que suga tudo.

A mim já me sugou a energia. Toda. Toda, toda, toda. A que tinha e a que nunca tive. Não aguento mais.