Acho que é coisa própria de quem vive no meio da música e trabalha no meio de vozes. Notar cada tom, cada inflexão. Apercebermo-nos, inconscientemente, de como a pessoa respira, do subir e descer do volume, das hesitações. Da dicção - essa coisa dos profissionais e que os profissionais, sem querer, estão sempre a analisar na humanidade inteira. Profissional ou não.
Deve ser defeito (profissional, lá está) detectar sinais de riso mesmo antes de esse riso surgir. Deve ser feitio esta forma que se encontra de saborear vozes - de as conhecer melhor do que conhecemos as pessoas, de nos deixarmos levar e envolver por elas. E perder nelas, em certos momentos.
Deve ser por culpa desta vida que levo que há vozes que me ficam guardadas na cabeça. Deve ser por isso que me basta fechar os olhos para conseguir ouvir essas vozes, cá dentro, como se as pessoas estivessem a falar ao meu lado. Não na perspectiva insane da coisa; apenas na perspectiva da memória, da recordação. Relembrar cada hesitação, cada riso, o tom de cada palavra, aquela inflexão, aquele timbre. Aquela doçura. Aquele conjunto que une tudo isto e que me deixa sem chão desde o primeiro dia.
Do geral para o particular, sim. Porque há vozes que mexem mais connosco do que outras, porque há vozes que basta ouvirmos uma única vez e nunca voltamos a esquecer. Porque há vozes que, como disse lá atrás, nos levam. Vozes em que nos envolvemos e nos perdemos. E, fechando os olhos, conseguimos recordá-las em cada pormenor.
(Mas é claro que isto é tudo estritamente profissional. Prefiro manter o assunto nessa esfera. Por questões de sanidade, é evidente.)
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